INSTITUTO DE TEOLOGIA REFORMADA JOHN WYCLIFFE
São Bernardo do Campo – SP
DONS ESPIRITUAIS E OPERAÇÕES DIVINAS: UMA DISTINÇÃO NECESSÁRIA NA TEOLOGIA CESSACIONISTA
Autor: Pr. Kleiton Fonseca
São Bernardo do Campo – SP
2025
RESUMO
Este artigo tem como objetivo demonstrar, sob a perspectiva cessacionista, que os dons espirituais extraordinários foram concessões soberanas e arbitrárias de Deus, concedidos com finalidades específicas, sobretudo na era apostólica, e que devem ser distinguidos das operações divinas realizadas por meio da fé. Argumenta-se ainda que, mesmo na própria era apostólica, observa-se uma diminuição progressiva dos sinais miraculosos, reforçando a natureza temporária desses dons.
Palavras-chave: Dons espirituais. Cessacionismo. Operações divinas. Fé. Teologia bíblica.
1 INTRODUÇÃO
A discussão sobre os dons espirituais permanece relevante em meio à teologia cristã contemporânea. A tradição cessacionista sustenta que os dons extraordinários — como profecia, línguas e curas — cessaram com o encerramento da era apostólica e o fechamento do cânon bíblico. Essa posição, frequentemente mal compreendida, não nega a ação divina no presente, mas afirma que os dons extraordinários não são mais distribuídos como ofícios regulares na igreja, pois cumpriram sua função histórica.
2 O DOM COMO CONCESSÃO ARBITRÁRIA DE DEUS
A teologia paulina ensina que os dons espirituais são dados “a cada um, individualmente, conforme quer” (1Co 12.11). Ou seja, os dons não são adquiridos por esforço, santidade ou fé pessoal, mas são atos soberanos e arbitrários de Deus, manifestando-se conforme o propósito divino.
Essa arbitrariedade significa que o portador do dom não tem controle sobre sua manifestação, nem poder de reproduzi-lo à vontade. Por isso, o dom difere de qualquer operação espiritual ordinária, como fé, oração, intercessão e até mesmo experiências subjetivas de consolo ou livramento.
3 A OPERAÇÃO DIVINA PELA FÉ: DIFERENTE DE UM DOM
Nas Escrituras, também encontramos múltiplos exemplos de ações divinas realizadas pela fé, sem que isso implique a presença de um dom carismático. A oração pela cura, descrita em Tiago 5.15, é um caso clássico: “a oração da fé salvará o enfermo, e o Senhor o levantará”.
O texto não menciona que o orante possua um “dom de cura”. A ênfase recai na soberania de Deus e na fé exercida na oração, não em uma habilidade espiritual residente no indivíduo.
4 A DIMINUIÇÃO DOS DONS NA ERA APOSTÓLICA
Paulo, no fim de seu ministério, deixou Trófimo doente em Mileto (2Tm 4.20); Timóteo foi orientado a tomar vinho por causa de suas enfermidades (1Tm 5.23), e João, no Apocalipse, apesar de ser o último apóstolo vivo, não realiza milagres, mas registra revelações proféticas.
Esses dados indicam que os dons extraordinários estavam ligados a um momento específico da revelação redentiva e não deveriam ser considerados permanentes na vida da igreja.
5 TESTEMUNHOS HISTÓRICOS DE MILAGRES SEM DONS APOSTÓLICOS
Mesmo após a era apostólica, há relatos de intervenções milagrosas de Deus, realizadas não por portadores de dons, mas por meio da oração, fé ou providência divina. Agostinho de Hipona, João Calvino, Hudson Taylor e George Müller são alguns exemplos de testemunhos que reforçam a distinção cessacionista: Deus continua operando, mas os dons extraordinários, como ministérios normativos e apostólicos, não persistem.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A teologia cessacionista sustenta que os dons extraordinários foram atos arbitrários e soberanos de Deus, concedidos com propósitos fundacionais à revelação e ao estabelecimento da igreja. Tais dons não podem ser confundidos com as operações divinas que ocorrem pela fé, oração ou providência. Ao reconhecer essa distinção, evitamos tanto o misticismo quanto o racionalismo, sustentando uma fé sólida na suficiência das Escrituras e na soberania do Deus que ainda age, mas conforme Sua Palavra.
REFERÊNCIAS
AGOSTINHO. A Cidade de Deus. São Paulo: Paulus, 2006.
CALVINO, João. Comentário sobre Tiago. Grand Rapids: Baker Book House, 2009.
CARSON, D. A. Showing the Spirit. Grand Rapids: Baker Academic, 1987.
MACARTHUR, John. Strange Fire. Nashville: Thomas Nelson, 2013.
SPROUL, R. C. A Obra do Espírito Santo. São José dos Campos: Fiel, 2021.
WARFIELD, B. B. Counterfeit Miracles. New York: Scribner's, 1918.
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