IGREJAS QUE NASCEM DA DIVISÃO: UMA MALDIÇÃO DISFARÇADA DE AVIVAMENTO
POR Pr. Kleiton Fonseca
RESUMO
O presente artigo busca abordar criticamente o fenômeno contemporâneo da proliferação de igrejas evangélicas oriundas de divisões internas, em vez de missões organizadas e legitimadas pela igreja visível. Por meio da análise bíblica, teológica e pastoral, este trabalho propõe um retorno ao padrão apostólico de plantação de igrejas, baseado na unidade, no chamado e na missão. Faz-se uso de experiências pessoais e comentários de teólogos e missionários históricos, a fim de demonstrar que a divisão eclesiástica, quando motivada pela carnalidade, é uma maldição disfarçada de crescimento.
Palavras-chave: Divisão. Igreja. Missão. Unidade. Plantação. Ministério.
“Edificados sobre o fundamento dos apóstolos e dos profetas, sendo o próprio Cristo Jesus a principal pedra de esquina.” (Ef2.20)
1 INTRODUÇÃO
A narrativa de Atos dos Apóstolos fornece o modelo neotestamentário para a plantação de igrejas: oração, jejum, reconhecimento comunitário e envio pela igreja mãe sob a direção do Espírito Santo (At 13.1-4). Não há espaço nas Escrituras para a fundação de comunidades eclesiásticas fruto de rebeldia ou divisão. Segundo John Stott:
“A missão da igreja está inseparavelmente ligada à sua unidade. A desunião da igreja desmente o evangelho que ela prega.”
2 A LEI DA SEMENTE E O PRINCÍPIO DA ORIGEM
A Bíblia ensina que “tudo o que o homem semear, isso também ceifará” (Gl 6.7). Igrejas semeadas em contenda colherão frutos de escândalo, desordem e frieza espiritual. Como afirmou David Brainerd:
“A obra de Deus não pode ser feita com espírito carnal. A ambição que divide o rebanho, mancha o altar.”
3 MOTIVAÇÃO MISSIONÁRIA: AMOR PELAS ALMAS, NÃO VITRINE RELIGIOSA
Jesus declarou que veio buscar e salvar o perdido (Lc 19.10). Esse deve ser o norte de toda plantação de igreja. Quando uma comunidade nasce para “mostrar que também pode” ou por causa de desentendimentos, não é um projeto do céu, mas uma construção da carne. A.W. Tozer afirmou:
“É possível que uma igreja cante hinos com fervor, mas se a motivação for orgulho e competição, Deus os rejeita como barulho vazio.”
4 EXPERIÊNCIA PESSOAL: QUATRO IGREJAS, QUANDO O CAMINHO REVELA A VERGONHA
Não posso deixar de compartilhar uma experiência que se repete a cada semana: todas as vezes que sigo rumo à nossa congregação, passo por quatro igrejas, uma de frente para a outra. Todas com placas diferentes, nomes distintos, sons altos, estilos variados. Cada uma afirma cantar ao mesmo Deus, pregar sobre o mesmo Cristo e ser templo da mesma Presença. Mas nenhuma se saúda, nenhuma coopera, nenhuma reconhece a outra como parte do mesmo Corpo.
Essa cena revela o fruto de um espírito divisionista que se disfarça de avivamento. É um retrato doloroso de um cristianismo que diz falar línguas celestiais, mas não consegue falar a língua que Deus nos deu para a comunhão humana: o diálogo, o perdão, a unidade.
5 REQUISITOS PARA O MINISTÉRIO: PASTORES, NÃO POLÍTICOS
Conforme 1 Timóteo 3 e Tito 1, o ministério pastoral exige caráter, doutrina e testemunho. Não basta ter “chamado” emocional ou ambição. É preciso ser irrepreensível, apto para ensinar, manso, hospitaleiro, fiel no lar e respeitado por fora. Segundo Hernandes Dias Lopes:
“Divisões no Corpo de Cristo são cicatrizes que envergonham o nome de Jesus diante do mundo. A igreja que nasce da carne, opera na carne e morre na carne.”
6 O FUNDAMENTO DOS APÓSTOLOS: A BASE INEGOCIÁVEL
Efésios 2.20 afirma que a igreja deve estar “edificada sobre o fundamento dos apóstolos”. Isso implica em fidelidade à doutrina, submissão à Palavra e comunhão eclesiástica. Igrejas que nascem desconectadas do Corpo maior e que desprezam a tradição apostólica estão construídas sobre areia.
7 UM CLAMOR POR ARREPENDIMENTO E REFORMA
É tempo de chorar pelos nossos pecados e buscar uma reforma profunda na eclesiologia contemporânea. Precisamos voltar ao padrão bíblico: igrejas enviadas, não divididas; pastores vocacionados, não autopromovidos; evangelho puro, não marketing religioso.
8 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Divisão nunca foi missão. É tempo de arrependimento e retorno à simplicidade bíblica. Igrejas devem nascer por vocação, envio e amor, não por disputa, mágoa ou desejo de controle. A plantação eclesiástica é algo sagrado — jamais deve ser banalizado. Que o Senhor levante igrejas bíblicas, comprometidas com a verdade e com a comunhão.
“Se o Senhor não edificar a casa, em vão trabalham os que a edificam.” (Sl 127.1) “Todo reino dividido contra si mesmo será arruinado, e toda cidade ou casa dividida contra si mesma não subsistirá.” (Mt 12.25)
Plantar igrejas é bíblico, glorioso e necessário. Mas plantar igrejas sem amor, sem unidade, sem submissão à Palavra — é maldição, não missão. Que o Senhor nos dê discernimento para reconhecer quando a “visão” é apenas divisão, e coragem para rejeitar fundações construídas sobre feridas não tratadas.
Precisamos de igrejas que nasçam como resposta ao clamor do céu, e não como reflexo da disputa na terra.
REFERÊNCIAS
BÍBLIA. Almeida Revista e Atualizada. Barueri: Sociedade Bíblica do Brasil, 1993.
BRAINERD, David. Journals and Letters. 1745.
LOPES, Hernandes Dias. A igreja que Deus abençoa. São Paulo: Hagnos, 2013.
STOTT, John. A missão cristã no mundo moderno. Viçosa: Ultimato, 2001.
TOZER, A. W. A igreja: a grande paixão de Cristo. São Paulo: Mundo Cristão, 1950.
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